quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Solidariedade e sociabilidades libertárias

Nos próximos assuntos abordados no blog do ISVA estaremos discutindo o tema da solidariedade e sociabilidades libertárias. Abrimos o espaço para todos que quiserem colaborar. Segundo Reclus, a declaração dos direitos humanos refere-se à liberdade do homem, de liberdade completa e absoluta, mas ela se engana, se esta liberdade não se encontra limitada pelo amor e pelos deveres, pois “só o homem livre pode sem segundas intenções estreitar contra seu peito a seu irmão e dizer-lhe: te amo” (Reclus, apud Bellido, 2009:145). Acrescenta que a dominação que ocorre no mundo, não é só econômica, mas é também espiritual. A luta cotidiana, no trabalho, na sociedade, deve estar acompanhada pela luta por um pensamento livre.
Estamos cansados de saber que a questão econômica é a principal raiz dos problemas sociais. A desigualdade social, a carência das coisas mais essenciais da vida: alimentos, saúde, habitação, por exemplo.
O que se pode fazer para mudar essas coisas? Bastam palestras? Escritos? Essas coisas por certo ajudarão, mas não seria melhor mudar radicalmente a sociedade que vivemos?
Como povos de outras regiões resolveram seus problemas? Por que até hoje não resolvemos os nossos?
Cada um de nós deve ter uma explicação.
Sendo assim, gostaria inicialmente de recordar a vocês a experiência humana em nosso planeta. Como se sabe, uma geração corresponde ao tempo necessário para que uma espécie possa reproduzir-se. Os arqueólogos falam que já se passaram cerca de 10 milhões de anos, ou seja, um milhão de gerações entre os humanos. Os orangotangos se reproduzem, por exemplo, entre os 7 e 8 anos de idade; os gorilas e os chimpanzés comuns entre os 6 anos e meio e os 8, e para os homens arcaicos um termo médio de 11 anos. Nosso ancestral comum viveu cerca de 5 milhões de anos (700 mil gerações), os australopitecos permaneceram só 3 milhões de anos (300 mil gerações); os homens arcaicos viveram durante um milhão e oitocentos mil anos (cerca 170.000 gerações) e os homens modernos apareceram faz 180 mil anos (14 mil gerações): "disso resulta que o número de gerações que nos separa de nosso antepassado comum com os gorilas e chimpanzés e, por conseguinte, do começo da diversificação de nossa raça, é de aproximadamente 1.200.000 anos. Simplifiquemos a um milhão de gerações, uma cifra já incrível de antepassados extintos e envoltos na neblina do tempo" (Chaline, 2002, p. 21-22).
Nesse milhão de gerações ocorreram diferenças genéticas e morfológicas. O paleontólogo (estudo dos seres antigos) persegue as marcas da história de vida e a do homem em particular, chamam-nos de paleoantropólogo. "O pré-historiador se dedica a reconstrução das sociedades humanas que nos precederam. Ambos trabalham como inspetores de polícia, embora com indícios mais limitados. No entanto, o Paleontólogo e o pré-historiador dispõem atualmente de métodos muito eficazes para identificar os sinais de vida. Usam métodos paleoquímicos para reconstruir ambientes físicos e climas, indícios de fauna e flora com a finalidade de avaliar a biodiversidade da vida em uma época determinada. Empreende análises bioquímicas, biologia molecular e celular, cromossômica, embriológica, de anatomia comparada e de forma para identificar todas as estruturas dos fósseis" (Ibidem, p.23).
Na sociedade moderna, o sociólogo, procura entender as diferentes formas de organização social, juntamente com outras áreas das ciências sociais e ciências sociais aplicadas, como a antropologia, a economia, o direito, a psicologia, a geografia, a educação, procurando dar uma radiografia do homem moderno em toda sua pluralidade e complexidade, embora, sempre esteja imbuído de uma perspectiva política que lhe ampara nas formulações sobre os problemas sociais. Daí considerarmos a sociologia anarquista, como Bellido, como uma cultura política de resistência
Dentre as invenções humanas, talvez a mais importante tenha sido a linguagem e o processo de comunicação. A possibilidade de se comunicar e de elaborar acordos e convenções. A idéia de discutir e decidir sobre a melhor maneira de vivermos em grupo. É possível que tenhamos enveredado por caminhos não muito ajustados na relação social com base no amor e na solidariedade. Inúmeras sociedades foram construídas sobre o império do medo, da opressão, escravidão, mas, por sua vez, como tudo na vida ruíram e se extinguiram.
As primeiras sociedades humanas, as que comumente, chamamos sociedades indígenas, foram construídas com base nas relações de parentesco, não havia necessidade de escolas, juízes ou polícias, isto é, eram sociedades sem Estado. Em caso de conflitos, formavam grupos de guerreiros para combater os inimigos. Em suas aldeias, porém, as contendas eram decididas através do diálogo, sem intermediação. O trabalho coletivo era repartido para todos, não havia os que comiam e os que passavam fome como em nossas sociedades atuais. A propriedade era coletiva, de todos, caçavam, pescavam e cultivavam para todos. Pesquisas antropológicas demonstram que o tempo de trabalho de inúmeras aldeias indígenas não chegavam a 4 horas diárias e eram entrecortadas por banhos e festas.
Mas, diremos, o mundo mudou. Mudou. Uma das piores invenções do mundo moderno com certeza foi a arma de fogo. Deu poder superior a grupos que dominam sociedades e que dispunham desses instrumentos para dominar outros povos que apenas possuíam arcos e flechas. Países e Estados construíram armas ainda mais letais que os rifles de repetição que dizimaram povos em várias partes do mundo. Os mísseis e foguetes teleguiados, a bomba atômica, a guerra química.
Enfim, nos consideramos seres evoluídos e agora estamos preocupados com o futuro do planeta, com as pandemias, com as milhares de pessoas que morrem de fome, com as mudanças climáticas, provocadas pelo avanço dessas tecnologias chamadas de ponta.
Gostaria de chamar a atenção para aquilo que eu falei que era uma das maiores invenções humanas, a comunicação. Ela transformou-se agora em um dos grandes problemas, pois grupos privados e estatais têm o controle sobre os meios de comunicação e conseguem com isso, inculcar nos corações e mentes da população toda sorte de intrigas e mentiras, de criação de pânico e medo, que servem aos seus próprios interesses para comercialização de algum produto.
Ou seja, o maior triunfo do ser humano, o diálogo, transformou-se em um monólogo surdo que facilita a cooptação e a manipulação dos seres humanos para objetivos puramente comerciais e até criminosos, voltados para o lucro das grandes empresas que mais destroem nosso planeta.
Com essas palavras iniciais, gostaria de incitar novas discussões não com uma idéia pessimista de que nada tem jeito, ao contrário, acredito numa mudança a partir de nós mesmos, tomando como base a idéia de que a transformação deve partir de nossas mentes e conferir um papel importante para a educação, mas não aquela educação burocrática, baseada em prêmios e castigos, na seletividade, mas sim, naquela, educação que Proudhon, Bakunin, Reclus, Kropotkin, Ferrer, Paulo Freire e muitos outros ensinaram, de uma educação solidária, libertadora e libertária, sem arrogância, com a qual se possa acreditar que outro mundo é possível e, onde, estão engajados muita gente nesse esforço que é ao mesmo tempo individual e coletivo.
Eduardo Nunes

2 comentários:

Anônimo disse...

Afinal o que nos move? Desejos, sonhos, realidades, necessidades?
E como situar-nos no mundo globalizado e como situar-me?

Necessitamos de tanta tecnologia?
Que alternativas temos nesse mundo que está montado?

Anônimo disse...

quem é Reclus ?